A amamentação e as mães por adoção
Você que é mãe por adoção ou que ainda está na fila à espera de seu filho já sentiu uma ponta de tristeza ao pensar não ser possível amamentar o seu bebê?
Eu, como mãe por adoção, durante a minha espera pelo filho tão desejado, sentia uma tristeza por saber que não teria leite para ele, caso chegasse em fase de ser amamentado. Mães adotantes geram seus filhos em suas almas. É algo muito complexo, pois geramos nossos filhos, esperamos por eles, sem saber onde estão, como e quando chegarão. Não sabemos se já estão nascidos ou não ou se estão vivendo em alguma instituição ou se estão negligenciados por sua família biológica por aí.

Meu bebê, gestado em minha alma por 21 meses, chegou aos meus braços em seu 2º dia de vida. Era muito pequenininho, mas super saudável, graças aos bons cuidados de sua genitora. Eu pensei que conseguiria leite humano para ele no banco de leite, mas tive uma surpresa ao saber que o leite para lá doado é apenas para os bebês em situação de risco nas UTIs neo-natais. Enquanto eu vivia essa busca, eu também sentia a mãe biológica, pensava em sua dor, em seus peitos cheios de leite e em seu útero vazio que sangrava a ausência do bebezinho que ela carregou e nutriu para mim por 9 meses. Em minha gratidão eu desejava a cura de sua dor, que, por sua vez, me ofertava felicidade.
Busquei informação com especialistas em amamentação e elas me ajudaram e me ensinaram a usar recursos para estimular a chegada do meu próprio leite, mesmo sem ter parido. Eu não imaginava que isto poderia ser possível, mas era. Elas me ensinaram a colocar a fórmula em um copo que ia para uma sonda que ficava bem colada ao meu mamilo e assim ele poderia sugar e essa sucção funcionava como um estímulo para a produção do meu próprio leite. No entanto, o meu leite não foi produzido. Porém, a consequência feliz de tudo isso foi que eu amamentei o meu filho afetivamente. Sim, eu amamentei. Esta prática nos proporcionou momentos de muita proximidade e intimidade, promovendo o vínculo mãe-bebê. Eu e ele vivemos a amamentação relacional, afetiva. Pele com pele, olho no olho, colo quentinho e muito amor.
Amamentar, para além de dar alimento ao bebê, é também dar amor, é criar laços, é nutrir afetivamente. A mãe adotiva pode não ter o leite materno, mas ela tem o amor. O bebê adotado viveu rupturas e chega em luto pela separação de sua mãe biológica. Pegá-lo no colo quentinho e dizer a ele “Oi, eu sei o que você passou e agora eu sou a sua mãe. Nunca mais iremos nos separar. Entendo e acolho a sua dor. Estou aqui e estaremos juntos como mãe e filho para sempre” é o maior alimento que este bebê pode receber. Para além do leite quentinho que chega pela mamadeira ou pela sonda, estabelece-se o vínculo de forma tranquila e feliz, para sempre.
Neste agosto dourado, como é chamado o mês dedicado à intensificação das ações de promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno no Brasil, vejo lindas e delicadas fotos sendo postadas por mães que amamentaram ou amamentam seus filhos, além de muitos textos e vídeos promovendo a amamentação. O leite materno é o alimento padrão ouro e muitas mães desejam amamentar seus bebês, mas sabemos que nem sempre isto é possível e, o fato de não conseguirem não as torna menos dedicadas e nem quer dizer que seus bebês não serão saudáveis. Em vista disto, decidi contar a minha história para dizer que, sim, o leite materno vale ouro, amamentar é muito importante, mas quando a mãe não tem o leite materno, ela pode, sim, investir nesta nutrição afetiva, que fará muito bem para o bebê e, principalmente, para ela, neste lugar dinâmico e de eterna construção que é o de ser mãe.
Valéria Serrão, mãe por adoção do Estêvão, em 05/08/20.